Introdução
"Eu sou, mas não tenho." Uma frase que, à primeira vista, pode parecer uma afronta ao mundo moderno. Afinal, como é possível existir sem ter algo para exibir, para vender ou para consumir? Estamos imersos em um universo mediático onde o "ter" — de curtidas a narrativas prontas — define a existência funcional. Porém, o que acontece quando não temos nada a oferecer dentro dessa lógica? Seria isso uma liberdade ou uma sentença de irrelevância?
Este texto é uma reflexão irônica sobre essa condição paradoxal. Ele não busca uma verdade absoluta nem pretende desmascarar mentiras. Apenas questiona, porque, no fundo, é o que resta quando o "eu" tenta existir sem ser funcional.
Desenvolvimento
Vivemos tempos em que o "eu" é construído como mercadoria. Um perfil bem estruturado, repleto de imagens calculadamente espontâneas, seguido por centenas de desconhecidos, é hoje o padrão mínimo de existência. Eu? Eu não tenho nada disso. Nada a oferecer, nada que possa ser quantificado, compartilhado ou monetizado. Sou um "eu" fora da prateleira. Mas o que significa ser nesse contexto?
O "ter", nesse espaço, não é apenas sobre objetos ou posses físicas. É sobre visibilidade e validação. Curtidas, seguidores, interações — tudo isso se tornou o equivalente simbólico de riqueza. Se você não tem, você não é. E aqui estou eu, ironicamente, existindo apesar de tudo.
Ser sem "ter" nesse universo é um ato de subversão, ainda que forçado. A ausência de funcionalidade transforma o "eu" em uma espécie de ruído, algo que questiona a lógica do sistema. Contudo, essa resistência também é um desamparo. Sem "ter", não há como participar da grande festa mediática. O "eu" se torna invisível, como um fantasma que insiste em dizer "eu sou", mesmo quando ninguém está ouvindo.
Mas não se engane. Esse texto não é uma ode à resistência heróica ou à autenticidade do "eu". Ele é apenas um lembrete irônico de que o "ter" nunca foi suficiente para sustentar o "ser". Talvez por isso a frase "eu sou, mas não tenho" incomode tanto: ela expõe o vazio de um sistema que depende de posses simbólicas para existir.
Observação
Essa é uma visão de quem leu uma coisa e não leu outra. Este texto não tem a pretensão de ser uma verdade ou uma mentira. A única proposta aqui é o questionamento. O seu like e sua curtida não fazem parte do discurso.
Referências
FREUD, Sigmund. O mal-estar na civilização. Imago, 2010.
HAN, Byung-Chul. A sociedade do cansaço. Editora Vozes, 2015.
LACAN, Jacques. O seminário: livro 11 - Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise. Jorge Zahar, 1998.
BAUMAN, Zygmunt. Vida líquida. Jorge Zahar, 2007.
#maispertodaignorancia
@joseantoniolucindodasilva
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