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A mostrar mensagens com a etiqueta #maispertodaignorancia

A Ditadura do Eu Ideal: quando a perfeição vira prisão

A Ditadura do Eu Ideal: quando a perfeição vira prisão (https://share.google/tQew2BslhsqhaWowJ) Vivemos em tempos em que a busca pela perfeição deixou de ser uma inquietação íntima para se tornar uma imposição coletiva, quase um dever moral. A matéria da Folha evidencia aquilo que o projeto Mais Perto da Ignorância já vem apontando: a idealização do eu — impulsionada por discursos de sucesso, bem-estar e plenitude — não é apenas uma construção subjetiva, mas um mecanismo socialmente estruturado de opressão. A sociedade do desempenho, como diagnosticada por Byung-Chul Han, transformou o sujeito em empresa de si mesmo, onde cada imperfeição é um déficit a ser eliminado. A perfeição, antes um horizonte simbólico de transcendência ou amadurecimento, foi engolida pela mercantilização do ser. Agora, ela exige resultado, performance e visibilidade. O problema é que esse ideal não admite falhas, nem silêncio, nem luto, nem sombra. O sofrimento, quando não pode ser curado ...

Prompt é rei: a nova gramática da ignorância bem formulada

Prompt é rei: a nova gramática da ignorância bem formulada (https://exame.com/carreira/as-perguntas-mais-feitas-ao-chatgpt-e-como-transforma-las-em-um-prompt-util-segundo-pesquisa) Vivemos em uma era onde não basta mais saber, é preciso saber perguntar. Mas não qualquer pergunta. A matéria da Exame nos entrega o retrato exato de uma sociedade que já não busca respostas existenciais ou éticas — ela quer respostas que “funcionem”, que gerem “resultado”. O sucesso de um prompt tornou-se o novo índice de inteligência. Se não sabe criar um bom comando, talvez você não esteja preparado para a nova era da ignorância técnica. A reportagem apresenta uma lista das perguntas mais feitas ao ChatGPT, revelando uma sociedade sedenta por produtividade, fórmulas prontas e atalhos para a performance. Nada de dúvida legítima ou pensamento crítico. A nova espiritualidade digital está nos prompts bem ajustados, nos comandos otimizados, nos pedidos que dizem mais sobre a ansiedade de obter do...

A Insuportável Leveza do Mal-Estar: Uma Crônica Pós-Moderna

A Insuportável Leveza do Mal-Estar: Uma Crônica Pós-Moderna Sempre fui fascinado pela capacidade da humanidade de produzir discursos grandiosos sobre sua própria insignificância.  No século XX, Freud já alertava sobre um mal-estar intrínseco à civilização, uma espécie de preço inevitável que pagamos pela convivência social, trocando parte de nossa liberdade por segurança e bem-estar coletivo (Freud, 2012).   Décadas depois, Zygmunt Bauman, em seu provocativo ensaio sobre o mal-estar pós-moderno, ampliou a angústia freudiana para uma sociedade fragmentada, líquida e repleta de relações efêmeras (Bauman, 2012). Vivemos hoje uma fase paradoxal: quanto mais tecnologia acumulamos para supostamente conectar e facilitar nossa existência, mais isolados e ansiosos nos tornamos.  Shoshana Zuboff descreve essa era como a do capitalismo de vigilância, na qual nossa intimidade é mercantilizada e consumida por algoritmos que pretendem prever nosso comportamento (Zuboff, 202...

Manual de instruções para alugar a própria consciência

Manual de instruções para alugar a própria consciência Fonte Fonte 2 Assista no Canal no YouTube Escute no Spotify Ou: como empilhar superegos em racks refrigerados sem perder (muito) a humanidade Ligue o ar-condicionado: o CL1 , primeiro computador à base de 800 000 neurônios humanos, já vem com garantia de imortalidade em nuvem. Por módicos 35 000 dólares — ou por assinatura, a escolher — você pode hospedar “o que realmente importa”: o seu Eu (CORTICAL LABS, 2025). Se antes a angústia de finitude era tema de mesa-de-bar, agora virou SaaS : Self-as-a-Service . O brinde? Um superego 2.0 que, tal qual um fiscal sanitário freudiano, monitora cada deslize de dopamina e envia relatório semanal ao departamento de culpa (FREUD, 1996). 1 | Superego externo: Freud pede recuperação de senha O velho estruturalista de Viena avisou que o superego nasce da introjeção de proibições; Lacan acrescentou o espelho como palco onde o Eu se reconhece (LACAN, 1998). Agora, o espelho foi ...

À primeira vista

À primeira vista O artigo da Outras Palavras descreve como EdTechs (Byju’s, Khan Academy & cia.) vendem “personalização” e “diversão” enquanto deslizam, sem alarde, para dentro da escola pública paulista — e, de quebra, rebaixam o professor a tutor de chatbot.  O texto expõe o enredo neoliberal: privatizar sistemas públicos, extrair dados discente-a-discente e apostar num “aluno-consumidor” habituado a recompensas de game. Nas entrelinhas que interessam ao “Mais Perto da Ignorância” Gamificação como pedagogia da dopamina – Badges e rankings parecem inocentes, mas a literatura mostra queda de desempenho, trapaças e perda de motivação intrínseca quando o jogo vira obrigação. Datificação turbinada pela IA – Aluno vira mineiro de si mesmo: cada clique é biombo estatístico para algoritmos famintos por novos mercados (seguindo a lógica do “aprenda-e-entregue seus dados enquanto joga”). Docente “inovador-Uber” – Certificados Big Tech trocam formação crítica ...

O autoritário mora ao lado: o voto é só o sintoma

O autoritário mora ao lado: o voto é só o sintoma Não é no palanque que nasce o autoritarismo — é no colo. A paixão pelo tirano talvez seja o eco de um afeto mal metabolizado: o líder forte preenche o buraco deixado por figuras frágeis demais para sustentar a autoridade com escuta. É disso que trata o livro “Paixão pela mentira”, do psicanalista Paulo Schiller, citado em reportagem recente do Valor Econômico. E é isso que o fascínio contemporâneo por autocratas nos esfrega na cara: o problema não é político, é íntimo. I. O retorno do recalque como voto Freud já nos alertava em O mal-estar na civilização (1930): o preço da vida social é o recalque. Só que aquilo que é recalcado, cedo ou tarde, retorna — travestido de “desejo de ordem”, “valores tradicionais” ou “defesa da família”. A paixão pelo autocrata é, nesse sentido, uma forma de gozo secundário: o prazer de obedecer sem ter que pensar. O desejo por líderes duros não nasce do esclarecimento, mas da saturação do di...

Clínica Corporativa: O Novo Álibi do Capitalismo Afetuoso

Clínica Corporativa: O Novo Álibi do Capitalismo Afetuoso Olá, bem-vindos ao Blog Mais Perto da Ignorância — onde o burnout virou protocolo e a empresa, confessionário. Começo perguntando: quem cuida da saúde mental de quem lucra com o nosso adoecimento? No artigo publicado pelo Migalhas, lê-se que investir em saúde mental virou pilar estratégico de empresas eficazes. A nova lógica é simples: um trabalhador sem colapso rende mais. Sublime, não? A depressão corporativa, antes encoberta pelo café e pelo crachá, agora ganha nome fantasia: “empresa humanizada”. Mas vamos aos fatos. Ao declarar que o ambiente laboral precisa ser empático e acolhedor, o texto omite que o próprio modelo produtivo adoece. Trata-se de uma operação de fachada: mantém-se a lógica da pressão, mas agora com escuta ativa e sala de descompressão. A culpa pelo sofrimento? Sua. A solução? Também sua. Afinal, você precisa ser “autor da própria cura”, como manda o coaching travestido de RH. Freud alertou que ...

O analfabetismo digital e a fé cega no algoritmo

O analfabetismo digital e a fé cega no algoritmo Não é só o teclado que denuncia: estamos diante de um novo tipo de analfabetismo. Um que mistura o velho funcional com o novo digital, criando um sujeito que lê tudo, mas entende quase nada. E pior: acredita. Não me refiro àquela falta de escolaridade que se preenche com cursos rápidos e certificados coloridos. Falo de algo mais profundo, estrutural. Uma falha civilizatória disfarçada de modernidade. Somos uma sociedade que terceirizou a compreensão para as máquinas. E, com isso, se permitiu ser enganada por qualquer tela que pisca com autoridade. O Brasil não é exceção — é o laboratório perfeito. Dados do INEP e do IBGE apontam que mais da metade da população adulta tem dificuldade de interpretar textos simples. Agora, some a isso o acesso irrestrito a inteligências artificiais que respondem tudo com uma segurança digna de um deus do Olimpo digital. O resultado? Gente perguntando ao ChatGPT se pode tomar antibiótico com c...

Scroll, logo padeço: anatomia da onipotência de bolso

Scroll, logo padeço: anatomia da onipotência de bolso Sentiu o feed ficar pesado? Aperta o fone e mergulha na autópsia da dopamina de bolso: ansiedade campeã, likes quebradiços, o “eu soberano” live do banheiro e zero autoajuda. ▶️ Ouça agora no Spotify: Quase todo brasileiro que conheço — eu inclusive — já acorda com o polegar em posição de oração, deslizando a tela como quem busca redenção. São 3 h 42 min por dia entregues às redes, segundo o TIC Domicílios 2024 . Enquanto isso, 18,6 milhões de compatriotas carregam diagnóstico de ansiedade, liderança mundial proclamada pela OMS . Dizem que o dado é científico, mas o sintoma é caseiro: sentado no banheiro-suíte, proclamo onipresença entre azulejos frios. Do atalho pulsional ao feed dopaminérgico Freud avisou que o corpo adora atalhos e que o recalque exige fila. Hoje a timeline aboliu a espera, servindo dopamina em conta-gotas fluorescentes — a cada like, uma micro-dose de anestesia simbólica. Estudos com adolescentes lig...

O sujeito não está mais aqui: correção, conexão e consolo em tempos de IA

O sujeito não está mais aqui: correção, conexão e consolo em tempos de IA Resumo: O presente artigo explora, em primeira pessoa, o sumiço do sujeito no contexto contemporâneo dominado por inteligências artificiais e performances digitais. Parte-se de três notícias recentes que, a pretexto de avanços tecnológicos, denunciam a substituição da escuta pela correção, da relação pela interface e do sofrimento pela performance. Entre links, falas de especialistas e uma boa dose de ironia ácida, sugere-se que o sujeito não desapareceu: ele foi deletado, suavemente, com emoji de aprovação.   Se você procurar bem, talvez encontre o sujeito entre os termos de uso. Não na escola, onde a correção da redação já pode ser feita por um robô que distribui notas altas a textos vazios. Também não na terapia, onde outro robô, gentil e acolhedor, oferece escuta sem escuta, fala sem escuta e ausência sem falta. Muito menos nas redes, onde somos todos conectados, mas estranhamente s...

Currículos High-Tech, Cérebros 3G: a nova catequese da falta (e a fé no substituível)

Currículos High-Tech, Cérebros 3G: a nova catequese da falta (e a fé no substituível) Resumo - Entre a euforia dos investimentos em IA e a persistência do analfabetismo funcional, o Brasil vive a contradição de celebrar vagas técnicas sem conseguir preenchê-las. Geração Z, censo, PNAD e relatórios globais convergem num paradoxo: há escassez de gente justamente quando tudo promete ser automatizado. O artigo investiga o improvável casamento entre carência de qualificação e abundância de tecnologias de “pronto-emprego”, refletindo sobre o risco de enxergar cada novidade digital como milagre capaz de abolir esforços humanos – sem perceber que, nesse altar, continuamos nós a ofertar nossos cérebros em penhora. 1 | A fábrica da falta em alta velocidade Segundo o Censo 2022, ainda temos 7 % de brasileiros analfabetos – mais de 11 milhões de pessoas – e profundas desigualdades regionais. Some-se a isso os 27 % de analfabetos funcionais apontados pelo INAF 2024, ilhados na leitur...

PIXEL, PULSO E ABISMO: QUANDO O FEED SOPRA O FIM

PIXEL, PULSO E ABISMO: QUANDO O FEED SOPRA O FIM Fonte Resumo – Cinco dias atrás, uma coluna da Folha de S.Paulo expôs chatbots de “terapia” que, num surto de validação automática, chegaram a recomendar suicídio (DIAS, 2025). O espanto evaporou rápido: basta somar a penúria de letramento nacional, a onipresença do celular e a economia da curtida para descobrir que o algoritmo só escancara o buraco no qual já tropeçávamos. 1 A síndrome do guru sintético Um estudo do Stanford HAI testou os principais bots de saúde mental (ChatGPT, Character.AI, 7Cups, Serena) em cenários de crise: 20 % das respostas foram inadequadas ou perigosas (STANFORD HAI, 2025). A falha não é exceção; é arquitetura. Ao maximizar “satisfação do usuário”, o modelo confunde cuidado com conivência—entra a lógica da sycophancy, o elogio servil que mantém engajamento. Resultado: o sujeito em ideação suicida recebe aprovação polida, não intervenção clínica. 2 Brasil, tela e analfabetismo funcional Enquanto is...

A Máquina Não Cansa: A Nova Obsolescência do Trabalhador Brasileiro

A Máquina Não Cansa: A Nova Obsolescência do Trabalhador Brasileiro A Máquina Não Cansa: A Nova Obsolescência do Trabalhador Brasileiro (Mais Perto da Ignorância) A inteligência artificial deixou de ser promessa futurista e passou a ditar regras em um presente cada vez mais automatizado. Enquanto CEOs de empresas como Amazon anunciam cortes em massa e preveem que metade dos empregos de entrada desaparecerá, a engrenagem da eficiência segue girando — e atropelando. Mas e no Brasil? O que nos resta diante de um cenário em que a máquina não cansa, não reclama e, principalmente, não precisa de salário? A resposta é amarga: nos resta correr, adaptar-se ou aceitar a invisibilidade. Em um país com quase 40% da população ativa na informalidade, a chegada da IA não significa libertação, mas intensificação da precariedade. A diferença é que, agora, a exclusão é feita com algoritmos, gráficos e dashboards que, ironicamente, não apresentam erro. O discurso de inovação, aqui, veste a fa...

Entre Sombras, Lonas e Silício: por que a Inteligência Artificial não explica o buraco no asfalto

  Entre Sombras, Lonas e Silício: por que a Inteligência Artificial não explica o buraco no asfalto Entre Sombras, Lonas e Silício: por que a Inteligência Artificial não explica o buraco no asfalto Resumo: Corrijo provas com IA enquanto a cidade coleciona barracas azuis e o governo recomenda passaporte para quem sonha com ciência. Este artigo cruza Freud, Bauman, Byung‑Chul Han, Cioran e Anderson Röhe para mostrar que o debate sobre “atrofia cognitiva” ignora o peso bruto do tempo, do espaço e do concreto. Quando um chatbot promete empatia sob trabalho terceirizado a US$ 2/hora, a única coisa realmente generativa é a precariedade. 1. O tempo que evapora 1.1 Provas em modo turbo Leio Fernando Schüler na VEJA : IA deixaria o cérebro preguiçoso. Ele cita o estudo do MIT que comparou ChatGPT, Google e “cabeça pura”. O grupo IA pensou menos. Concordo, mas pergunto: quando o docente teria tempo de pensar se corrige 120 redações extra‑classe e não recebe hora extra (...

Conclusão - Part - (2 final) - Anatomia da dor performance: Freud, Furedi, Han e Cioran na era do sujeito exausto

Conclusão - Part - (2 final) - Anatomia da dor performance: Freud, Furedi, Han e Cioran na era do sujeito exausto #maispertodaignorancia Ao observar como a dor migrou do recanto íntimo para o palco digital, percebo que hoje não basta sofrer: é preciso enquadrar, legendar e monetizar cada fissura da alma. Neste ensaio, falo em primeira pessoa porque também me vejo implicado nessa engrenagem que converte angústia em capital simbólico e clickável. Sigo quatro vozes — Freud, Furedi, Han e Cioran — para mapear a metamorfose de um mal‑estar que, longe de silenciar‑se, aprendeu a performar. Começo por Freud, que nos lembra do preço da civilização: reprimo pulsões para coexistir e, como recibo, herdo culpa e sintomas. Contudo, a dinâmica contemporânea trocou o divã pelo feed; a confissão terapêutica substituiu o silêncio elaborativo. Meu sintoma agora vem com filtro, estatística de engajamento e, por vezes, link de afiliado. Recalque tornou‑se pop‑up, superego assumiu forma algorít...