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O eu digital: soberania ilusória, vínculos corroídos e o suicídio como sintoma civilizatório

O eu digital: soberania ilusória, vínculos corroídos e o suicídio como sintoma civilizatório #ianaoeprofissionaldasaudemental  #maispertodaignorancia Setembro Amarelo chegou novamente. Mas, ao contrário das campanhas higienizadas que circulam nos outdoors ou nas timelines, os dados recentes lembram que o suicídio permanece como um dos maiores problemas de saúde pública do planeta. A Organização Mundial da Saúde estima que uma em cada 100 mortes no mundo decorra do suicídio (OMS, 2025). No Brasil, os números seguem em crescimento, sobretudo entre jovens e adultos jovens. O que isso nos diz? Que as campanhas que insistem em slogans como “se precisar, peça ajuda” podem até sensibilizar, mas não respondem à dimensão estrutural do problema. O que emerge é um sujeito isolado, responsabilizado e infantilizado ao mesmo tempo. O indivíduo é chamado a ser soberano de si, gestor de suas emoções, resiliente diante de crises e ansiedades. Mas essa soberania não passa de ficção. Élis...

Infância em curto-circuito: quando a educação vira dopamina sob demanda

Infância em curto-circuito: quando a educação vira dopamina sob demanda LINK ORIGINAL: https://www.infomoney.com.br/saude/ia-generativa-sera-devastadora-para-a-educacao-das-criancas-diz-ted-chiang/#webview=1 #maispertodaignorancia Ted Chiang não fala como tecnófobo, mas como alguém que percebeu o que se perdeu no brilho do “atalho cognitivo”: a dificuldade. Em seu alerta, a IA generativa não é só uma ferramenta, mas a encarnação de uma ilusão — a de que o aprendizado pode ser reduzido a estímulo rápido, barato e indolor. A crítica de Chiang soa incômoda porque toca na ferida de um tempo que confunde dopamina com conhecimento. A Dra. Anna Lembke já descreveu em Nação Dopamina que vivemos em uma economia límbica, onde tudo é calibrado para estimular prazer imediato. Se o smartphone é a seringa digital que fornece microdoses constantes de estímulo, a IA generativa é a droga premium: oferece respostas prontas, elimina a fricção e suprime a experiência fu...

Cartilha para domar o caos”: quando o Estado terceiriza a infância ao algoritmo e depois culpa o professor

“ Cartilha para domar o caos”: quando o Estado terceiriza a infância ao algoritmo e depois culpa o professor LINK ORIGINAL (Folha de S.Paulo): https://www1.folha.uol.com.br/colunas/painel/2025/08/prefeitura-de-sp-lanca-cartilha-para-professores-combaterem-violencia-e-adultizacao-nas-escolas.shtml #maispertodaignorancia Se há algo mais previsível do que a próxima “solução pedagógica” em PDF é o fato de que ela chegará tarde, com linguagem assepticamente correta e uma promessa imprudente: “orientar” o que a política pública não financia e o que o mercado digital sabota. A Prefeitura de São Paulo lançou uma cartilha para professores “combaterem a violência e a adultização nas escolas” — um documento oportuno num país que normalizou o improviso na educação e a externalização dos custos do mundo online para a sala de aula. Mas o gesto também denuncia um vício estrutural: transformar o professor em para-raios moral, regulador de danos tecnológicos e mediador de crises sociais fab...

Máquinas de aprender, corpos de adoecer: por que o ensino algorítmico nos esgota?

Máquinas de aprender, corpos de adoecer: por que o ensino algorítmico nos esgota? 🎧👉 Podcast Mais perto da ignorância Blog Mais Perto da Ignorância #maispertodaignorancia A promessa contemporânea de aprendizado mediado por máquinas, chatbots e inteligências artificiais baseadas em algoritmos generativos é apresentada como revolução pedagógica, emancipação cognitiva e democratização do saber. Discursos midiáticos alardeiam a figura de um “Sócrates digital”, pronto a interpelar com perguntas, simular diálogos e conduzir estudantes à autonomia crítica. Mas, ao contrário da aura emancipatória que circula em propagandas e reportagens, o aprendizado algorítmico revela uma face paradoxal: ele gera desgaste físico, psíquico, biológico, material, estrutural e social. Essa afirmação não parte de mera impressão. Ela se sustenta na análise de fenômenos psico-bio-sociais contemporâneos que, combinados com o avanço tecnológico e a lógica neoliberal, produziram uma mutação no modo como ...

Nação dopamina e seus silêncios: uma crítica psico-bio-social e tecnológica ao discurso reducionista do vício digital

Nação dopamina e seus silêncios: uma crítica psico-bio-social e tecnológica ao discurso reducionista do vício digital 📺 👉 Texto Introdutório Resumo Este artigo propõe uma análise crítica da obra Nação Dopamina de Anna Lembke, frequentemente utilizada como referência explicativa para o vício nas redes sociais. O texto examina os limites do diagnóstico neuroquímico ao contrastá-lo com perspectivas de Freud, Marx, Byung-Chul Han, Cathy O’Neil, Jonathan Haidt, Jean Twenge e Christopher Lasch. A reflexão tensiona o discurso midiático que se apoia exclusivamente na dopamina como explicação do mal-estar contemporâneo, questionando de forma irônica — à maneira de Emil Cioran — se não estaríamos transformando uma molécula em desculpa universal. O artigo articula aspectos psico-bio-sociais e tecnológicos, ressaltando que o vício digital é inseparável de estruturas históricas, políticas e econômicas. 🎧👉 Podcast Anna Lembke inicia Nação Dopamina descrevendo que “a balança entre dor...

O SILÊNCIO QUE VIROU DADO, E O DADO QUE NOS DEVORA

O SILÊNCIO QUE VIROU DADO, E O DADO QUE NOS DEVORA #maispertodaignorancia A conversão apressada do pensamento em dado soa como um milagre no ocidente em colapso — o paralisado recupera a fala, o silenciado fala de novo, o passado se torna presente. Mas o que se vende é paralisia da voz, não do corpo: o silêncio interior é oferecido como mercadoria digital, fragmentado, exposto, convertido. Liescience e Financial Times estampam o feito: implantes cerebrais decodificam “inner speech” com até 74 % de acerto, protegidos apenas por uma senha mental — o célebre “chitty chitty bang bang” como gatilho libertário, ironicamente plastificado pela tecnologia. (Livescience ; FT). A rigor, o que se propõe é a colonização da última fortaleza humana: o silêncio mental. Esses experimentos são publicados na revista Cell, um dos templos da ciência moderna, mas o enredo extrapola o biomédico — toca o existencial. Le Monde relaciona os implantes a tratamentos de epilepsia, depressão resistente ...

Do título comprado à angústia vendida: genealogia da falta como mercadoria

Do título comprado à angústia vendida: genealogia da falta como mercadoria 🎧👉 Podcast Mais perto da Ignorância 👉📺👉 Assista em nosso canal O que a burguesia fez com os títulos de nobreza, o capitalismo contemporâneo faz com a subjetividade. Eis a linha histórica que raramente aparece nas análises rápidas sobre “mercantilização da filosofia”: o que se negocia não é apenas cultura, mas a própria falta. Na origem, a burguesia não tinha sangue azul, mas tinha dinheiro. Como não podia inventar linhagem, comprava títulos. Era o modo de transformar ausência em valor social, de converter déficit em legitimidade. Esse gesto fundante não morreu; ele se atualiza. Hoje, não compramos baronatos, mas compramos identidades: cursos de “propósito de vida”, diagnósticos que nos nomeiam, certificados digitais de sabedoria. O mecanismo é idêntico: a falta é transformada em mercadoria. Freud talvez sorrisse com cinismo ao reconhecer a operação. Em O mal-estar na civilização, mostrou que a a...

Entre a chupeta e o colapso: quando o eu se dissolve em dados

Entre a chupeta e o colapso: quando o eu se dissolve em dados 🎧👉 Podcast O que antes era um gesto infantil hoje se tornou performatividade de influenciador: adultos postando selfies com chupetas na boca. Parece só mais uma excentricidade algorítmica, mas esse gesto é sintoma de uma forma mais profunda de regressão psíquica: não à infância real, mas à simulação digital de um eu que nunca precisou se construir. Um eu que se autorreconhece apenas por aquilo que consegue registrar, postar, filtrar, medir e repetir. Um eu que deixou de ser corpo para virar input. Neste ensaio, à luz da psicanálise freudiana e dos atravessamentos contemporâneos de autores como Zuboff, Roudinesco, Twenge e Han, exploramos as dimensões psíquicas, sociais e materiais desse novo modo de existir. O projeto Mais Perto da Ignorância não propõe saídas, mas perfurações. E não há ironia maior do que a de uma sociedade onde a regressão infantil se torna marca de estilo e algoritmo de engajamento. ...

Rolando o feed até o esgotamento: quando o prazer mínimo é a nossa sentença máxima

Rolando o feed até o esgotamento: quando o prazer mínimo é a nossa sentença máxima É curioso — ou talvez trágico — perceber como a primeira ação de milhões de brasileiros ao acordar não é respirar fundo, espreguiçar-se ou sentir a luz da manhã, mas sim deslizar o dedo por uma tela brilhante. Um gesto simples, quase imperceptível, que, na verdade, condensa um século de transformações na economia psíquica, social e política. Segundo levantamento das empresas We Are Social e Meltwater, em 2024 havia 187,9 milhões de internautas no Brasil — 86,6% da população — conectados em média 9 horas e 13 minutos por dia, majoritariamente por smartphones. É o equivalente a passar mais de um terço da vida desperto mergulhado em um oceano algorítmico, onde a superfície reluz, mas o fundo é invisível. Essa vida atravessada pela conectividade não é neutra. Ela redefine o que entendemos por corpo, tempo, prazer e até sofrimento. Freud, em O mal-estar na civilização, já advertia que a técnica am...

O dia em que a distopia virou manual de instruções

O dia em que a distopia virou manual de instruções Vivemos numa época em que as distopias não são mais advertências, mas tutoriais. 1984 deixou de ser a ficção paranoica de um inglês ressentido para tornar-se o roteiro operacional dos data centers, que hoje substituem o “Grande Irmão” pela lógica dos algoritmos de engajamento. O que antes era teletela é agora um feed infinito, calibrado para garantir que você não apenas veja o que deve ver, mas também esqueça o que não deve lembrar. Orwell imaginou um Estado que reescrevia a história; nós aperfeiçoamos o método — terceirizamos para máquinas que não precisam dormir, não têm remorso e conhecem nossas preferências mais íntimas, inclusive aquelas que nunca confessaríamos nem sob tortura. Se Huxley estava certo ao dizer que não precisaríamos de coerção, mas apenas de prazer, então vivemos a era do soma ubíquo. Só que, em vez de comprimidos distribuídos pelo Ministério do Bem-Estar, temos um cardápio diversificado: an...