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Entre pedras, algoritmos e espelhos rachados: o amor como responsabilidade sem sentido

Fonte Assista em nosso Canal no YouTube Entre pedras, algoritmos e espelhos rachados: o amor como responsabilidade sem sentido LEAD O amor nunca esteve no outro. Essa é a tragédia — e talvez a última ética possível. O que chamamos de relacionamento virou funcionalidade algorítmica, e o desejo, um projeto logístico. Mas e se amar fosse, como sugeriu Diotima, uma forma de suportar a falta? E se o eu soberano fosse apenas um ruído narcísico que ecoa no vazio do outro? O amor que não se completa: Diotima e o desejo sem retorno Platão nunca deu voz direta a Diotima.   Ela não aparece no Banquete, só é evocada por Sócrates — e é justamente por isso que sua presença é tão poderosa. Ela não é corpo, é ausência. Não é argumento, é travessia. E o que ela ensina a Sócrates é simples e letal: o amor não é plenitude, é falta organizada. Desejamos aquilo que nos escapa. O amor é daimon, não é deus nem mortal. Ele é ponte — e como toda ponte, treme. Mas hoje não queremos pontes, quere...

Espelho fosco, sublimação falha: por que a literatura algorítmica não nos redime

Espelho fosco, sublimação falha: por que a literatura algorítmica não nos redime Por José Antônio Lucindo da Silva – #maispertodaignorancia 24/06/2025 Introdução “Em 2025, escrever ignorando a inteligência artificial é antirrealismo”, proclama Jorge Carrión em entrevista recente à Veja . Tomo a frase como ponto de partida – e de atrito. Se escrever com IA é inevitável, isso não a transforma, por milagre, num novo Gênesis literário. Continuamos presos ao mesmo teclado, apenas com um espelho estatístico mais reluzente na frente dos olhos. 1 O espelho fosco da IA Carrión vende a máquina como parceira criativa; eu a vejo como DJ de restos : empilha “cadáveres linguísticos” a partir de distribuições de probabilidade. Los campos electromagnéticos – livro que o próprio autor coproduziu com GPT-2 e GPT-3 – deixa isso claro: quanto mais “original” o output, mais perceptível a colagem. Liquidez reciclada, diria Bauman; tudo já nasce usado antes do cursor piscar. ...

Cansaço social e tédio gourmetizado: ironias da exaustão contemporânea(ou por que até a sua fadiga virou plano de assinatura)

Cansaço social e tédio gourmetizado: ironias da exaustão contemporânea (ou por que até a sua fadiga virou plano de assinatura) José Antônio Lucindo da Silva  joseantoniolcnd@gmail.com #maispertodaignorancia Resumo Entre o “burnout social” ‒ popularizado pela imprensa digital ‒ e o “bore-out” ‒ tédio corporativo elevado à categoria de rótulo premium ‒ abriga-se uma mesma engrenagem de autoexploração. Partindo do artigo de Machado (2025) sobre o “cansaço social” e do ensaio irônico publicado no blog Mais Perto da Ignorância (SILVA, 2025), discuto, em primeira pessoa, como a medicalização pop terceiriza à autocura os efeitos de uma economia que mercantiliza tanto a hiperatividade quanto o vazio. Amparo-me em Byung-Chul Han, Freud e Cioran para argumentar que o diagnóstico mainstream converte sintomas em conteúdo e o descanso em KPI; a solução, vendida como detox digital, preserva intacto o sistema que exige performance infinita. Concluo que admitir a exaustão ‒ sem transfo...

Buffet de Liberdade, Estômago de Plástico

Buffet de Liberdade, Estômago de Plástico Eu, sujeito que já travou diante de 24 marcas de azeite no mercado, parei para ler a BBC me explicar por que continuo insatisfeito mesmo depois de apertar “comprar agora” . Descobri que isso tem nome bonito — paradoxo da escolha — e traz um veredicto ainda mais cruel: quanto mais latas na prateleira, mais a sensação de que nenhuma serve. Mas hoje quero ir um passo antes desse paradoxo. Porque, convenhamos, não é falta de opção que nos corrói; é a ausência de critério que precede qualquer clique. Se o sentido virou self-service, eu me sirvo sem fome — e saio culpado por não sentir saciedade. A polaridade se instala: comparar (sofrer) ou engajar (sofrer com curtidas). Duas coxias do mesmo teatro algorítmico. No feed, a escolha performa como liberdade: deslizo para a direita e sou “maximizador”, deslizo para a esquerda e viro “satisfator” zen. Nos bastidores, o script é idêntico: manter-me orbitando entre ansiedade e alívio, num balé d...

Do Cavalo de Guerra ao Avatar Frustrado: Confissões de um Macho Beta em Extinção

Do Cavalo de Guerra ao Avatar Frustrado: Confissões de um Macho Beta em Extinção “Quando a espada descobre que o inimigo é a própria tela, restam dois caminhos: fiar a trama ou furar o reflexo.” 1 | Introdução: bem-vindos ao meu laboratório de ironias utilitárias Sente-se, respire fundo e me observe ao microscópio: sou o espécime pós-industrial que Scott Galloway batizou de “homem jovem inviável” (KAY, 2025). Tenho quatro vezes mais chance de me matar, três vezes mais risco de dependência química e doze vezes mais probabilidade de ser preso. Enquanto conto essas estatísticas, minhas contrapartes femininas compram imóveis, fazem pós-graduação e ainda mentem no censo para não ferir meu ego de provedor mambembe. Pergunto-me: em que momento o músculo virou figurante e o algoritmo tomou o papel principal? 2 | Da fábrica ao feed: um roteiro que não me pertence mais Pierre Bourdieu jurava que minha virilidade era “natural” porque o hábito a reproduz sem pensar (BOURDIEU, 1999). Fu...

O Delírio da Tela que Apodrece: Confissões de um Cérebro em 4 K

Assista no YouTube canal @maispertodaignorancia O Delírio da Tela que Apodrece: Confissões de um Cérebro em 4 K #maispertodaignorancia Não me peça moderação quando o próprio mundo empunha o smartphone como cajado de Moisés high-tech: com um toque, abre-se o Mar Vermelho da dopamina; com dois, fecha-se sobre a nossa presença de espírito. A Euronews batizou o fenômeno de “podridão cerebral” — termo tosco, mas sintomático: como se o lodo não fosse cultural, mas orgânico, bastando desligar o Wi-Fi para o córtex voltar a florescer. Pois bem: desliguei. Ainda estou aqui, só que a notificação fantasma lateja feito tinnitus pós-festa. 1. 88 % conectados, 22 % realmente dentro. O IBGE congratula-se: 88 % dos brasileiros (164,5 mi) usaram Internet nos últimos três meses. Carnaval estatístico! Mas o CETIC lembra: apenas 22 % possuem “conectividade significativa” — velocidade, franquia e dispositivo minimamente decentes para algo além do scroll penitencial.  Os demais navegam num e...