Buffet de Liberdade, Estômago de Plástico
Eu, sujeito que já travou diante de 24 marcas de azeite no mercado, parei para ler a BBC me explicar por que continuo insatisfeito mesmo depois de apertar “comprar agora” . Descobri que isso tem nome bonito — paradoxo da escolha — e traz um veredicto ainda mais cruel: quanto mais latas na prateleira, mais a sensação de que nenhuma serve.
Mas hoje quero ir um passo antes desse paradoxo. Porque, convenhamos, não é falta de opção que nos corrói; é a ausência de critério que precede qualquer clique. Se o sentido virou self-service, eu me sirvo sem fome — e saio culpado por não sentir saciedade. A polaridade se instala: comparar (sofrer) ou engajar (sofrer com curtidas). Duas coxias do mesmo teatro algorítmico.
No feed, a escolha performa como liberdade: deslizo para a direita e sou “maximizador”, deslizo para a esquerda e viro “satisfator” zen. Nos bastidores, o script é idêntico: manter-me orbitando entre ansiedade e alívio, num balé de indecisão pré-programada. Cada swipe confirma que sigo sem referencial; o like apenas mede a intensidade do meu não-saber.
Repare: antes de perguntar qual sapato comprar, deveria perguntar por que preciso mais um par — mas a timeline não tolera silêncio filosófico. Desço o polegar, a vitrine me convence a preencher o vazio com outra entrega expressa. Faço uma escolha para não encarar o fato de que nenhuma delas responde à pergunta que evitei: “o que, afinal, ‘eu’ quero quando digo que quero?”
Talvez a tessitura do paradoxo seja essa: o excesso de bifurcações revela que o mapa sumiu. Decidir torna-se performance desesperada de quem perdeu o norte e agora ostenta bússolas coloridas no pulso. No fim, volto para casa com três sabores de geleia e a mesma pergunta vazia — mas, ei, ao menos gerei engajamento.
Referências
BBC News Brasil. O que é o paradoxo da escolha, que nos deixa descontentes mesmo quando tomamos decisões. Disponível em:
https://www.bbc.com/portuguese/articles/cvgqj3ezllpo.
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José Antônio Lucindo da Silva
#maispertodaignorancia
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