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Borderline: o manual de instruções do vazio que a psiquiatria insiste em preencher com diagnósticos prontos

Borderline: o manual de instruções do vazio que a psiquiatria insiste em preencher com diagnósticos prontos #maispertodaignorancia O texto do Terra apresenta o borderline como uma lista de sintomas, quase um cardápio clínico de angústias: medo de abandono, instabilidade, impulsividade, vazio, raiva descontrolada. Tudo enumerado, esquadrinhado, como se a dor humana fosse uma coleção de itens a serem marcados em um questionário. Eis o triunfo da biopolítica: transformar a subjetividade em checklist. O sujeito que sangra é traduzido em sintoma; o sujeito que não cabe é reorganizado em critérios diagnósticos. A narrativa médica, ainda que necessária, carrega uma ironia cruel: o diagnóstico promete nomear o sofrimento, mas ao nomeá-lo, captura-o em grades conceituais. Freud já nos lembrava que não há cura para a condição de ser humano; há apenas manejos possíveis do mal-estar. Mas na sociedade do desempenho (Han), até o sofrimento precisa ser eficiente, classificado e rapidament...

Educação exausta e ansiedade endêmica: o Brasil em pós-modernidade espoliada

Educação exausta e ansiedade endêmica: o Brasil em pós-modernidade espoliada O Brasil não é um país do futuro: é um laboratório social onde a exaustão espreita os corpos que tentam se erguer na noite da EJA, e a ansiedade corrói os cérebros que rolavam feeds à espera de promoção. Segundo a OMS, o país é recordista mundial em transtornos de ansiedade, com 9,3 % da população afetada — cerca de 18,6 milhões de pessoas — enquanto a média global é só 3,6 % . Em 2024, estimam‑se 54 % dos brasileiros considerando a saúde mental o principal problema de saúde nacional — e está valendo lembrar que esse “problema” não é uma enfermidade individual: é o capital dizendo “mede‑se por desempenho”. Na tessitura biológica, psiquiatras apontam que os transtornos mentais respondem a fatores psicológicos, genéticos, sociais e ambientais — e especialmente financeiros nas camadas vulneráveis . É sintomático que, em 2024, o SUS contabilizou mais de 671 mil atendimentos relacionados à ansiedade...

A Ditadura do Eu Ideal 2.0 — quando perfeição vira prisão (e a performance vira ansiedade)Vivemos em tempos em que a busca pela perfeição deixou de ser uma inquietação íntima para se tornar uma imposição coletiva: quase um dever moral. O texto original da Folha e o diagnóstico do projeto Mais Perto da Ignorância sobre a idealização do eu já apontavam para isso. Mas agora, é preciso dizer que a perfeição foi plenamente incorporada pela lógica digital e mercantil — um regime de opressão sob a máscara do bem-estar.Byung-Chul Han, em Sociedade do cansaço, identificava a sociedade do desempenho, onde o sujeito vira uma empresa de si mesmo e cada falha é vista como um déficit. Hoje, esse sujeito-empresa vira um produto com perfil, métricas e bio otimizada — e somos forçados a ser “versões melhoradas” de nós mesmos.O problema não é só a vigilância: é que essa vigilância interiorizou-se. O supereu — freudiano, cruel — já não precisa castigar com desgosto; ele motiva, pontua, envia push: “medite melhor”, “seja positivo”, “seja produtivo”. O luto, o silêncio, a sombra — emoções humanas reais — são incompetências a serem eliminadas ou formas de mau conteúdo. O imperfeito não existe: é alienado. Somos cúmplices dessa vigilância que pagamos com atenção e insônia.E a biologia paga, claro. Jovens relatam exaustão, insônia, ansiedade crescente. A dopamina das curtidas paga o que a carne já não sustenta. Escolas no Brasil, especialmente em classes média-baixa, já vivem um paradoxo: a educação virou aplicativo emocional, coach de si mesmo. O vazio não é só emocional: é combustível da economia do afeto. A frustração como possibilidade foi banida; em seu lugar, só há engajamento superficial ou consumo compulsivo.Nesse cenário, o capitalismo predatório não vende só produtos — vende estados de espírito. A tristeza? Aqui está o serviço para transformá-la, “com filtro, claro.” A felicidade? Tem produto para amplificá-la e compartilhá-la. As emoções viraram mercadoria. O corpo cansado, o sujeito clivado, o falso self animado por notificações: tudo vira capital simbólico.Freud nos alertava: o supereu pode ser mais duro que qualquer tirania. Hoje essa tirania veste posts motivacionais. O sofrimento não pode ser ouvido, só consumido ou escondido. Como resistir? Talvez aceitando que não somos programas perfeitos — somos humanos falhos, finitos, inacabados. Talvez a única subversão se encontre na recusa da performance, na interrupção da apresentação.---Notas do AutorEste texto atualiza o original, aprofundando a análise nas camadas psíquica, biológica, social e econômica do eu digital idealizado. Ele incorpora críticas aos dispositivos tecnológicos e ao mercado emocional, reforçando o estilo corrosivo do Mais Perto da Ignorância — provocativo, não prescritivo.Palavras-chaveEu idealSupereu digitalEconomia da atençãoCorpo exauridoFonte inicial da discussão:“A Ditadura do Eu Ideal: quando a perfeição se torna prisão” — Mais Perto da Ignorância (17 jul. 2025).

A Ditadura do Eu Ideal 2.0 — quando perfeição vira prisão (e a performance vira ansiedade) 🎧👉 Podcast sobre o tema Vivemos em tempos em que a busca pela perfeição deixou de ser uma inquietação íntima para se tornar uma imposição coletiva: quase um dever moral. O texto original da Folha e o diagnóstico do projeto Mais Perto da Ignorância sobre a idealização do eu já apontavam para isso. Mas agora, é preciso dizer que a perfeição foi plenamente incorporada pela lógica digital e mercantil — um regime de opressão sob a máscara do bem-estar. Byung-Chul Han, em Sociedade do cansaço, identificava a sociedade do desempenho, onde o sujeito vira uma empresa de si mesmo e cada falha é vista como um déficit. Hoje, esse sujeito-empresa vira um produto com perfil, métricas e bio otimizada — e somos forçados a ser “versões melhoradas” de nós mesmos. O problema não é só a vigilância: é que essa vigilância interiorizou-se. O supereu — freudiano, cruel — já não precisa castigar com desgost...

Máquinas de aprender, corpos de adoecer: por que o ensino algorítmico nos esgota?

Máquinas de aprender, corpos de adoecer: por que o ensino algorítmico nos esgota? 🎧👉 Podcast Mais perto da ignorância Blog Mais Perto da Ignorância #maispertodaignorancia A promessa contemporânea de aprendizado mediado por máquinas, chatbots e inteligências artificiais baseadas em algoritmos generativos é apresentada como revolução pedagógica, emancipação cognitiva e democratização do saber. Discursos midiáticos alardeiam a figura de um “Sócrates digital”, pronto a interpelar com perguntas, simular diálogos e conduzir estudantes à autonomia crítica. Mas, ao contrário da aura emancipatória que circula em propagandas e reportagens, o aprendizado algorítmico revela uma face paradoxal: ele gera desgaste físico, psíquico, biológico, material, estrutural e social. Essa afirmação não parte de mera impressão. Ela se sustenta na análise de fenômenos psico-bio-sociais contemporâneos que, combinados com o avanço tecnológico e a lógica neoliberal, produziram uma mutação no modo como ...

Nação dopamina e seus silêncios: uma crítica psico-bio-social e tecnológica ao discurso reducionista do vício digital

Nação dopamina e seus silêncios: uma crítica psico-bio-social e tecnológica ao discurso reducionista do vício digital 📺 👉 Texto Introdutório Resumo Este artigo propõe uma análise crítica da obra Nação Dopamina de Anna Lembke, frequentemente utilizada como referência explicativa para o vício nas redes sociais. O texto examina os limites do diagnóstico neuroquímico ao contrastá-lo com perspectivas de Freud, Marx, Byung-Chul Han, Cathy O’Neil, Jonathan Haidt, Jean Twenge e Christopher Lasch. A reflexão tensiona o discurso midiático que se apoia exclusivamente na dopamina como explicação do mal-estar contemporâneo, questionando de forma irônica — à maneira de Emil Cioran — se não estaríamos transformando uma molécula em desculpa universal. O artigo articula aspectos psico-bio-sociais e tecnológicos, ressaltando que o vício digital é inseparável de estruturas históricas, políticas e econômicas. 🎧👉 Podcast Anna Lembke inicia Nação Dopamina descrevendo que “a balança entre dor...

Mente Alugada: A Voz Interior como Produto Neuro-econômico

Mente Alugada: A Voz Interior como Produto Neuro-econômico #maispartodaignorancia A neurociência invade nossa intimidade com a gravidade de quem sabe que, em breve, nossas “vozes interiores” poderão ser ouvidas como anúncios invasivos. O recente estudo do projeto BrainGate2 — sintetizando pensamentos em palavras “ouvíveis” — não restaura a humanidade: mercantiliza nossa consciência. Publicado em 14 de agosto de 2025, no prestigiado Cell, o trabalho de Kunz, Willett e colaboradores mostrou que máquinas conseguem decodificar aquilo que imaginamos dizer, com até 74 % de exatidão, ativando uma zona cinzenta entre o dentro e o fora, entre o subjetivo e o comercial . Isso nos lembra Bauman: a modernidade líquida transforma tudo — até o gesto mental mais íntimo — em dado, em mensagem a ser capturada, monetizada, transacionada. Aqui, a voz interior é reduzida a um ativo neuroeconômico, sujeito a licitação por algoritmos e chips. Não há esperança redentora, só mais uma capitalizaçã...

Quando o privado vira espetáculo: as confissões digitais como mercadoria barata

Quando o privado vira espetáculo: as confissões digitais como mercadoria barata LINK ORIGINAL: https://exame.com/inteligencia-artificial/depois-do-meta-ai-e-do-chatgpt-370-mil-conversas-de-usuarios-com-a-ia-grok-sao-indexadas-no-google ANÁLISE O episódio das 370 mil conversas do Grok indexadas no Google revela mais do que uma falha técnica — trata-se de uma ferida exposta na vulnerabilidade do oculto em plena era digital. A simplicidade do botão “compartilhar” converte diálogos privados em espetáculo público, como se confidências íntimas fossem sacralizadas, mas às mãos de buscadores, e não do divã do terapeuta. Usuários imaginavam estar no comando; na verdade, estavam alimentando um feitiço de exposição sem precedentes.   Aqui vale invocar Debord: o espetáculo não é um acúmulo de imagens, mas uma forma de dominação em que o íntimo se vê transformado em mercadoria. O privado se torna praça eletrônica. Bauman alertava: em tempos líquidos, fronteiras se dissolvem, in...