Educação exausta e ansiedade endêmica: o Brasil em pós-modernidade espoliada
O Brasil não é um país do futuro: é um laboratório social onde a exaustão espreita os corpos que tentam se erguer na noite da EJA, e a ansiedade corrói os cérebros que rolavam feeds à espera de promoção. Segundo a OMS, o país é recordista mundial em transtornos de ansiedade, com 9,3 % da população afetada — cerca de 18,6 milhões de pessoas — enquanto a média global é só 3,6 % . Em 2024, estimam‑se 54 % dos brasileiros considerando a saúde mental o principal problema de saúde nacional — e está valendo lembrar que esse “problema” não é uma enfermidade individual: é o capital dizendo “mede‑se por desempenho”.
Na tessitura biológica, psiquiatras apontam que os transtornos mentais respondem a fatores psicológicos, genéticos, sociais e ambientais — e especialmente financeiros nas camadas vulneráveis . É sintomático que, em 2024, o SUS contabilizou mais de 671 mil atendimentos relacionados à ansiedade — um acréscimo de 14,3 % em relação a 2023 . Não por acaso, a depressão atinge 5,8 % da população brasileira, sendo o país com maior prevalência na América Latina e o segundo nas Américas .
O IBGE, por sua vez, já sinalizava em 2019 que 29,1 milhões de adultos sofreram algum tipo de violência psicológica, física ou sexual — violência que perfura o tecido psíquico e acelera o desgaste simbólico dos corpos cansados. E se o ensino noturno exige corpos que estagramam do trabalho diário, a vulnerabilidade mental não se dissocia dessa precariedade materialista. O estudo Juventude no Brasil mostra que entre os jovens de 18 a 22 anos, 27,2 % trabalham por pura necessidade, e apenas 24,9 % por desejo de independência — ou seja, o ensino não é aspiracional, mas demanda por sobrevivência .
Do ponto de vista social, o suicídio é ouro friamente balizado em estatística pública: é a segunda principal causa de morte entre adolescentes (15–19 anos) e a quarta entre jovens adultos (20–29 anos) no Brasil . Dialogando com isso, o país figura em oitavo na lista dos que mais registram suicídios no mundo — sem contar que cerca de 32 pessoas tiram a própria vida a cada dia, um índice que supera muitas doenças crônicas .
Tecnologicamente, a plataforma digital encena sua própria forma de exaustão: o capitalismo informacional captura a atenção, extrai desejos e os reembolsa como dados. Esse arranjo sinistro sobrepõe-se ao corpo já exaurido pela rotina noturna de trabalho‑estudo. O fatídico encontro entre EJA, desespero econômico e vigilância algorítmica recria a anatomia da submissão.
Quando analisamos o entrelaçamento dessas dimensões, percebemos que a disfunção mental no Brasil não é “enfermidade” mas sintoma emergente da iniquidade estrutural. O ensino noturno torna-se mercadoria, e quem o busca o faz impelido por lógica de mercado. O cansaço não é psicológico puro — é biopolítica material cadastrado no corpo. A saúde mental ruge em sinais e boletins: ansiedade, depressão, suicídio — e o sistema sabe disso, já que tornou tais agravos de notificação compulsória pelo SUS via SINAN, e instituiu a RAPS, RENAST e campanhas como Setembro Amarelo .
Se educação noturna e economia da atenção são duas frentes de desgaste, a conjunção delas empurra o Brasil para a ribalta dos países mais adoecidos — e não por contágio moral, mas por entropia estrutural. Essa teoria pessimista não é pessimismo fácil, mas convite a desnaturalizar o que sistema vende como “sucesso via méritos”. Se a sala de aula nasce da exaustão, há que se perguntar: resistir é sustentar a máquina ou romper seus cabos?
Referências:
BRASIL. Ministério da Saúde. Saúde Mental em Dados – Edição nº 13. Brasília, 07 mar. 2025. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/saude-mental/saude-mental-em-dados/saude-mental-em-dados-edicao-no-13-fevereiro-de-2025/view. Acesso em: 24 ago. 2025.
BRASIL. PNS 2019. Pesquisa Nacional de Saúde (PNS). IBGE, 2019. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/saude/9160-pesquisa-nacional-de-saude.html. Acesso em: 24 ago. 2025.
IBGE. Juventude no Brasil. Wikipédia, 2025. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Juventude_no_Brasil. Acesso em: 24 ago. 2025.
OMS via Wikipédia. Ansiedade e depressão no Brasil. Wikipédia, 2025. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Ansiedade_e_depress%C3%A3o_no_Brasil. Acesso em: 24 ago. 2025.
IPSOS. Brasil é o 4º país mais estressado do mundo com 42% da população baseada em pesquisa, 2024. Disponível em: https://www.ipsos.com/pt-br/world-mental-health-day-2024. Acesso em: 24 ago. 2025.
VEJA. Brasil ocupa alarmante papel ... epidemia global de ansiedade. Abril, 24 jan. 2025.
Ministério da Saúde. Boletim Epidemiológico, vol. 55, n.º 4, fev. 2024. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/boletins/epidemiologicos/edicoes/2024/boletim-epidemiologico-volume-55-no-04.pdf. Acesso em: 24 ago. 2025.
Wikipédia. Suicídio no Brasil. Wikipédia, 2025. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Suic%C3%ADdio_no_Brasil. Acesso em: 24 ago. 2025.
Wikipédia. Saúde mental no Brasil. Wikipédia, 2025. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Sa%C3%BAde_mental_no_Brasil. Acesso em: 24 ago. 2025.
Palavras-chave:
Saúde mental Brasil, Ansiedade e exaustão, Educação EJA, Crítica capitalismo
, Suicídio jovem, Pedagogia pós-moderna
Notas do autor
Este texto é um ato de fricção, não de reconciliação. Ele parte da constatação de que a saúde mental não é desordem individual, mas mapa de injustiça estrutural. Resistir não é conforto: é tensão. E tensão que merece ser vista, não domesticada.
Fonte inicial da discussão:👉👓🗞️
https://iclnoticias.com.br/capitalismo-maquina-moer-vidas-visao-professor/
24/08/2025
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