O Amor Entre o Desejo e a Realidade: Uma Dança sem Fórmulas
O amor, há muito, foi romantizado como um ideal, uma promessa de completude, um encontro destinado a preencher as lacunas do ser. Mas, se olharmos com mais atenção, veremos que ele nunca foi sobre plenitude, mas sim sobre tensão, sobre a convivência entre desejo e realidade.
Diotima, no Banquete de Platão, dizia que o amor não é apenas a busca pelo belo, mas a busca de se fazer belo. Esse pensamento ecoa na sociedade contemporânea, onde a estetização do amor se confunde com sua vivência. Dentro do espaço digital e da lógica do desempenho, o amor é tratado como uma funcionalidade, um objeto que deve atender a expectativas calculadas. Isso nos conduz a um paradoxo: ao tentar encaixar o amor em padrões idealizados, ele perde sua potência transformadora.
Amar é habitar um campo de incertezas. Ele não se sustenta na perfeição, mas nas falhas, nos silêncios, nos espaços vazios que nos convidam ao encontro. No amor, não há uma resposta única. Há a presença do outro, que nos desafia, nos escapa e, ao mesmo tempo, nos obriga a nos posicionarmos. Como já refleti antes, o desejo não é bom nem ruim, ele simplesmente é, e o amor se inscreve nesse mesmo fluxo: não como algo a ser otimizado, mas como uma experiência que desafia o controle.
A contemporaneidade nos empurra para um modelo de relações descartáveis, onde o outro se torna uma funcionalidade dentro do discurso mediático. Como Byung-Chul Han sugere, vivemos um tempo onde o outro se transforma em uma não-coisa, um reflexo de nossas próprias idealizações. E, nesse cenário, o amor perde seu caráter subversivo, tornando-se um simulacro, uma satisfação instantânea que não chega a tocar a materialidade da experiência.
Amar, de fato, é aceitar que o outro não nos completa, mas nos provoca a sermos mais. É saber que ele não é um reflexo perfeito, mas um universo próprio que escolhemos explorar, sabendo que essa jornada nunca será livre de riscos. O amor não é apenas um sentimento, mas uma escolha. Escolher ficar, mesmo quando a tempestade chega. Escolher ver e ser visto, sem a necessidade de um espelho que nos devolva apenas aquilo que queremos enxergar.
No fundo, o amor é um ato de resistência. Resistência contra a objetificação, contra a mercantilização das relações, contra a busca incessante por um encaixe perfeito. Amar é manter vivo o espaço da tensão, da dúvida e do mistério, porque é nesse intervalo que a verdadeira entrega acontece.
Então, se você busca o amor, lembre-se: ele não é sobre encontrar o que falta em você. Ele é sobre se permitir ser visto e se comprometer a ver o outro, naquilo que ele é e no que vocês podem ser juntos. E isso, em sua imperfeição, basta.
Referências
Platão. O Banquete. São Paulo: Editora Martin Claret, 2018.
Byung-Chul Han. A Agonia do Eros. Petrópolis: Editora Vozes, 2019.
#maispertodaignorancia
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José Antônio Lucindo da Silva CRP:06/172551 joseantoniolcnd@gmail.com
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