Liberdade de Expressão: Um Discurso Condicionado pela Discursividade
A liberdade de expressão, esse conceito tão celebrado em democracias contemporâneas, parece cada vez mais um simulacro, um artifício discursivo que se molda às regras da própria discursividade hegemônica. Não se trata mais de um direito inalienável, mas de uma permissão condicional: pode-se falar, desde que dentro dos limites impostos pelo que é socialmente aceitável em determinado momento histórico. E quem determina esses limites? O politicamente correto, essa ferramenta que age como um mecanismo de controle da própria liberdade, travestindo-se de justiça social, mas que, no fundo, apenas reorganiza a censura sob novas roupagens.
Não é de hoje que percebo essa tendência. O discurso contemporâneo se constrói sobre a ilusão da inclusão e do respeito, mas às custas de um preço: a eliminação do contraditório. A pluralidade é permitida, desde que não ultrapasse os limites estabelecidos pelas sensibilidades sociais vigentes. Caso contrário, o sujeito que ousa questionar ou propor uma reflexão para além do permitido se torna alvo de um processo de exclusão, aquilo que se convencionou chamar de 'cancelamento'.
Bauman, ao discutir a liquidez das relações e das identidades, nos alertou para o fato de que o pertencimento tornou-se condicional. Hoje, para existir discursivamente, é preciso estar em conformidade com as normas da discursividade hegemônica. Ao menor sinal de dissidência, o indivíduo é colocado à margem, descredibilizado e, muitas vezes, silenciado. Byung-Chul Han aprofunda essa discussão ao afirmar que vivemos na sociedade do desempenho, onde o sujeito se autoexplora para se encaixar na performance discursiva aceita. A censura não é mais imposta de fora para dentro, mas internalizada, convertendo-se em autocensura.
O paradoxo da liberdade de expressão no mundo contemporâneo está justamente nessa contradição: um direito que só pode ser exercido dentro dos limites estabelecidos por aqueles que detêm o poder de definir o que é aceitável. A busca pelo ideal de justiça social através do politicamente correto pode ter a intenção de proteger grupos historicamente marginalizados, mas, no fim, apenas reconfigura as dinâmicas de silenciamento, estabelecendo novas hierarquias discursivas. Em nome da inclusão, novas formas de exclusão são implementadas, perpetuando um ciclo de controle do que pode ou não ser dito.
Se antes era o Estado ou a religião que determinavam os limites da expressão, hoje são os algoritmos e as sensibilidades sociais fabricadas nas prateleiras do mercado identitário. O discurso é mercantilizado, a polêmica gera engajamento e o cancelamento se torna um modelo econômico rentável. No final das contas, não há um compromisso real com a liberdade, mas sim com a gestão das emoções e das opiniões de forma a manter a estabilidade do sistema.
A liberdade de expressão, tal como se apresenta hoje, não é um direito, mas um privilégio condicionado. O que não for conveniente ao discurso vigente será inevitavelmente silenciado. Assim, enquanto insistirmos em viver nessa ilusão de liberdade, estaremos cada vez mais distantes da possibilidade de um verdadeiro debate plural.
Ironia Discursiva: O Triunfo da Liberdade (mas não muito)
Viva a liberdade de expressão! Hoje, posso dizer o que quiser, desde que não fira sensibilidades, não ultrapasse os limites do politicamente correto e esteja alinhado com as normas sociais vigentes. Ora, que maravilha! Nunca fomos tão livres... para repetir o que deve ser dito.
A grande conquista da modernidade foi a possibilidade de termos um discurso vigiado não mais por censores oficiais, mas por nós mesmos. A autocensura é o novo passaporte para a existência discursiva. Se eu me expresso, mas sou cancelado, a culpa é minha por não ter seguido o script correto. Não me adaptei ao mercado da virtude e, por isso, fui rejeitado. Byung-Chul Han estava certo ao dizer que o ócio virou um negócio, e eu acrescentaria que a própria liberdade também foi transformada em um produto regulado.
Mas sejamos otimistas! Afinal, ainda podemos falar... desde que não toquemos em certos assuntos. Isso significa que vivemos em um mundo plural e democrático, onde todos têm o direito de falar o que quiserem, contanto que sua fala esteja devidamente embalada dentro das normas discursivas corretas. Viva a inclusão excludente, a liberdade condicionada e a pluralidade padronizada!
Talvez, no fundo, tudo isso seja um grande teatro e estejamos apenas desempenhando os papéis que nos foram designados. Afinal, como dizia Emil Cioran, "o grande problema da humanidade é que ela leva a si mesma a sério demais". Mas não se preocupe, se você discordar, sempre haverá um espaço para você... fora do jogo.
#maispertodaignorancia @jose Antônio psico
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Referências:
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.
HAN, Byung-Chul. A Sociedade do Cansaço. Petrópolis: Vozes, 2017.
CIORAN, Emil. Breviário de Decomposição. São Paulo: Rocco, 2011.
Aqui está o artigo que escrevi para você:
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Liberdade de Expressão: Um Discurso Condicionado pela Discursividade
A liberdade de expressão, esse conceito tão celebrado em democracias contemporâneas, parece cada vez mais um simulacro, um artifício discursivo que se molda às regras da própria discursividade hegemônica. Não se trata mais de um direito inalienável, mas de uma permissão condicional: pode-se falar, desde que dentro dos limites impostos pelo que é socialmente aceitável em determinado momento histórico. E quem determina esses limites? O politicamente correto, essa ferramenta que age como um mecanismo de controle da própria liberdade, travestindo-se de justiça social, mas que, no fundo, apenas reorganiza a censura sob novas roupagens.
Não é de hoje que percebo essa tendência. O discurso contemporâneo se constrói sobre a ilusão da inclusão e do respeito, mas às custas de um preço: a eliminação do contraditório. A pluralidade é permitida, desde que não ultrapasse os limites estabelecidos pelas sensibilidades sociais vigentes. Caso contrário, o sujeito que ousa questionar ou propor uma reflexão para além do permitido se torna alvo de um processo de exclusão, aquilo que se convencionou chamar de 'cancelamento'.
Bauman, ao discutir a liquidez das relações e das identidades, nos alertou para o fato de que o pertencimento tornou-se condicional. Hoje, para existir discursivamente, é preciso estar em conformidade com as normas da discursividade hegemônica. Ao menor sinal de dissidência, o indivíduo é colocado à margem, descredibilizado e, muitas vezes, silenciado. Byung-Chul Han aprofunda essa discussão ao afirmar que vivemos na sociedade do desempenho, onde o sujeito se autoexplora para se encaixar na performance discursiva aceita. A censura não é mais imposta de fora para dentro, mas internalizada, convertendo-se em autocensura.
O paradoxo da liberdade de expressão no mundo contemporâneo está justamente nessa contradição: um direito que só pode ser exercido dentro dos limites estabelecidos por aqueles que detêm o poder de definir o que é aceitável. A busca pelo ideal de justiça social através do politicamente correto pode ter a intenção de proteger grupos historicamente marginalizados, mas, no fim, apenas reconfigura as dinâmicas de silenciamento, estabelecendo novas hierarquias discursivas. Em nome da inclusão, novas formas de exclusão são implementadas, perpetuando um ciclo de controle do que pode ou não ser dito.
Se antes era o Estado ou a religião que determinavam os limites da expressão, hoje são os algoritmos e as sensibilidades sociais fabricadas nas prateleiras do mercado identitário. O discurso é mercantilizado, a polêmica gera engajamento e o cancelamento se torna um modelo econômico rentável. No final das contas, não há um compromisso real com a liberdade, mas sim com a gestão das emoções e das opiniões de forma a manter a estabilidade do sistema.
A liberdade de expressão, tal como se apresenta hoje, não é um direito, mas um privilégio condicionado. O que não for conveniente ao discurso vigente será inevitavelmente silenciado. Assim, enquanto insistirmos em viver nessa ilusão de liberdade, estaremos cada vez mais distantes da possibilidade de um verdadeiro debate plural.
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Ironia Discursiva: O Triunfo da Liberdade (mas não muito)
Viva a liberdade de expressão! Hoje, posso dizer o que quiser, desde que não fira sensibilidades, não ultrapasse os limites do politicamente correto e esteja alinhado com as normas sociais vigentes. Ora, que maravilha! Nunca fomos tão livres... para repetir o que deve ser dito.
A grande conquista da modernidade foi a possibilidade de termos um discurso vigiado não mais por censores oficiais, mas por nós mesmos. A autocensura é o novo passaporte para a existência discursiva. Se eu me expresso, mas sou cancelado, a culpa é minha por não ter seguido o script correto. Não me adaptei ao mercado da virtude e, por isso, fui rejeitado. Byung-Chul Han estava certo ao dizer que o ócio virou um negócio, e eu acrescentaria que a própria liberdade também foi transformada em um produto regulado.
Mas sejamos otimistas! Afinal, ainda podemos falar... desde que não toquemos em certos assuntos. Isso significa que vivemos em um mundo plural e democrático, onde todos têm o direito de falar o que quiserem, contanto que sua fala esteja devidamente embalada dentro das normas discursivas corretas. Viva a inclusão excludente, a liberdade condicionada e a pluralidade padronizada!
Talvez, no fundo, tudo isso seja um grande teatro e estejamos apenas desempenhando os papéis que nos foram designados. Afinal, como dizia Emil Cioran, "o grande problema da humanidade é que ela leva a si mesma a sério demais". Mas não se preocupe, se você discordar, sempre haverá um espaço para você... fora do jogo.
#maispertodaignorancia @jose Antônio psico
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Referências
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.
HAN, Byung-Chul. A Sociedade do Cansaço. Petrópolis: Vozes, 2017.
CIORAN, Emil. Breviário de Decomposição. São Paulo: Rocco, 2011.
https://www.terra.com.br/noticias/entenda-o-relatorio-da-oea-sobre-liberdade-de-expressao-no-brasil,0086ba03a1b466934f87e05006318507x30ws5rn.html
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