A notícia publicada pela BBC Brasil, que destaca a aproximação entre os líderes das big techs e o presidente Donald Trump em sua posse, nos conduz a uma reflexão necessária sobre os limites éticos dessa aliança entre tecnologia e política. (Link para a notícia).
Ao observar figuras como Mark Zuckerberg, Jeff Bezos, Elon Musk e Sundar Pichai ocupando assentos de destaque em um evento político como esse, não é possível ignorar as implicações desse gesto. O que, à primeira vista, pode parecer uma tentativa de proteger interesses econômicos e tecnológicos, revela uma dinâmica preocupante de consolidação de poder entre o setor privado e o governo. Essa aliança ultrapassa questões mercantilistas; é uma questão de controle social e político.
Lembro aqui a análise de Edwin Black em IBM e o Holocausto, onde o autor expõe como tecnologias da época foram instrumentalizadas pelo regime nazista para perseguir e exterminar judeus de forma sistemática. O uso das máquinas da IBM, que permitiram categorizar e identificar indivíduos com precisão, é um exemplo de como a tecnicidade pode ser usada para oprimir. A história se repete, ainda que com novas ferramentas.
Hoje, as plataformas de big techs detêm dados detalhados sobre bilhões de pessoas. Elas sabem onde estamos, com quem interagimos, o que compramos e até como pensamos. Essa base de dados pode ser usada não apenas para fins comerciais, mas também para reforçar políticas autoritárias. Quando Trump promete deportações em massa, por exemplo, não é difícil imaginar como essas ferramentas podem ser usadas para identificar e perseguir grupos considerados indesejáveis.
A decisão de Zuckerberg de abandonar a checagem independente de fatos na Meta, sob a justificativa de priorizar a "liberdade de expressão", é emblemática. Essa mudança, celebrada pelos aliados de Trump, não representa apenas uma reaproximação política; é um abandono da responsabilidade ética que plataformas como Facebook e Instagram deveriam ter na contenção de desinformação. Isso nos leva a questionar: até que ponto essas empresas estão dispostas a sacrificar valores democráticos em troca de benefícios políticos?
O problema central não está na tecnologia em si, mas na forma como ela é utilizada. As big techs têm o poder de moldar comportamentos, influenciar eleições e manipular narrativas. Quando se tornam aliadas de governos que buscam consolidar poder a qualquer custo, criam-se condições para um controle social ainda mais profundo, como alertado por Shoshana Zuboff em A Era do Capitalismo de Vigilância. A questão que se coloca é: quem irá regulamentar essas ferramentas, se os próprios reguladores estão sentados ao lado dos controladores?
Essa notícia não deve ser lida como um fato isolado, mas como um sintoma de algo maior. Estamos diante de uma nova fase, onde as fronteiras entre poder político e corporativo estão cada vez mais tênues. E, nesse contexto, o cidadão comum, sem acesso aos bastidores desse "bromance", torna-se o alvo direto do controle.
Se não aprendermos com os erros do passado, como a aliança entre a IBM e o regime nazista, corremos o risco de repetir as mesmas atrocidades, apenas com ferramentas mais sofisticadas. A responsabilidade recai não apenas sobre os governos, mas também sobre a sociedade civil, que precisa exigir transparência e ética de quem controla as tecnologias que moldam nossas vidas.
Referências:
- BBC News Brasil. "Jeff Bezos, Elon Musk e outros barões das big techs na posse de Trump: a foto que exibe o 'bromance'." 20 de janeiro de 2025. Disponível em: BBC News Brasil.
- Black, Edwin. IBM e o Holocausto. 2001.
- Zuboff, Shoshana. A Era do Capitalismo de Vigilância. 2018.
Comentários
Enviar um comentário