Avançar para o conteúdo principal

Monólogo do Outro Invisível – Versão Popularmente Empática




Ah, o outro. Essa entidade misteriosa, tão próxima e, ao mesmo tempo, inatingível. Dizem que é preciso amá-lo, compreendê-lo, escutá-lo. Escutá-lo? Não me faça rir. A verdade é que somos mestres em ouvir apenas o eco da nossa própria voz. O outro não passa de um espelho mal polido onde enxergamos, distorcidos, nossos próprios temores e desejos. Mas aí vem o senso comum e diz: “Seja empático, coloque-se no lugar do outro”. Como se fosse fácil! Como se minha mente fosse uma sala de estar onde qualquer um pode entrar, sentar e tomar um café.

O discurso da empatia, no senso comum, é como um comercial de margarina: bonito, polido e completamente artificial. “Você só precisa sentir o que o outro sente, que mágica!” dizem. Claro, porque sentir dor, desespero e medo alheio é tão simples quanto mudar de canal. Mas ninguém te avisa que, ao entrar nesse universo empático, você carrega não só o peso do outro, mas o seu próprio multiplicado. Empatia parece tão charmosa na teoria quanto trágica na prática. No fim, o discurso popular sobre empatia é como receita de bolo no Instagram: parece lindo, mas a realidade é só uma bagunça de farinha e frustração.

E, claro, há quem diga que a empatia é uma virtude necessária para salvar o mundo. Uma ideia encantadora, mas esquecem que, no fundo, somos seres egoístas. O senso comum quer aplaudir quem demonstra empatia, mas, na prática, o que se faz mesmo é julgar quem falha em demonstrá-la. E, cá entre nós, quem nunca ignorou o outro que atire a primeira pedra. É mais fácil fingir que o outro não existe do que lidar com a bagagem emocional que ele carrega.

Agora, aqui estou eu, um visionário cego, tentando compreender essa dança estranha entre o eu e o outro. Um tango de pés descalços no chão áspero da vida. Mas, claro, sempre tropeçando. Porque, no final das contas, o outro é como uma obra de arte abstrata: você pode olhar por horas e nunca entender nada. E quem ousa dizer que entendeu... bem, está ainda mais perdido do que o resto de nós.

Então, continuamos nesse jogo patético de busca e fuga, aproximando-nos e afastando-nos do outro, cegos à alteridade e, ironicamente, surdos às respostas que ela nos dá. E sabe o que é mais trágico? Quanto mais tentamos entender o outro, mais nos afundamos na certeza de que, no fundo, não entendemos nem a nós mesmos.

Mas tudo bem, porque, no fim, o senso comum já nos deu a saída: finja que sente. Faça cara de “entendido”, balance a cabeça e diga “eu compreendo”. Afinal, empatia virou mais um papel no teatro social: um aplauso no final e ninguém precisa se preocupar com o que está fora do roteiro. Porque, no fundo, a verdadeira sabedoria está em aceitar que o outro é só mais um reflexo da nossa ignorância. Afinal, quanto mais perto estamos do outro, mais perto estamos de quê? Isso mesmo, da ignorância.

#maispertodaignorancia 
@joseantoniolucindodasilva


Comentários

Mensagens populares deste blogue

A Ilusão do Home Office: Uma Crítica Irônica à Utopia Digital

A Ilusão do Home Office: Uma Crítica Irônica à Utopia Digital Resumo Neste artigo, apresento uma análise crítica e irônica sobre a idealização do home office no contexto atual. Argumento que, embora o trabalho remoto seja promovido como a solução ideal para o equilíbrio entre vida pessoal e profissional, ele esconde armadilhas significativas. Além disso, com o avanço da inteligência artificial (IA), muitas das funções desempenhadas em home office correm o risco de serem substituídas por máquinas, tornando essa modalidade de trabalho uma utopia efêmera. Este texto foi elaborado com o auxílio de uma ferramenta de IA, demonstrando que, embora úteis, essas tecnologias não substituem a experiência humana enraizada na materialidade do trabalho físico. Introdução Ah, o home office! Aquela maravilha moderna que nos permite trabalhar de pijama, cercados pelo conforto do lar, enquanto equilibramos uma xícara de café em uma mão e o relatório trimestral na outra. Quem poderia imaginar ...

Eu, o algoritmo que me olha no espelho

  Eu, o algoritmo que me olha no espelho Um ensaio irônico sobre desejo, ansiedade e inteligência artificial na era do desempenho Escrevo este texto com a suspeita de que você, leitor, talvez seja um algoritmo. Não por paranoia tecnofóbica, mas por constatação existencial: hoje em dia, até a leitura se tornou um dado. Se você chegou até aqui, meus parabéns: já foi computado. Aliás, não é curioso que um dos gestos mais humanos que me restam — escrever — também seja um dos mais monitorados? Talvez eu esteja escrevendo para ser indexado. Talvez eu seja um sintoma, uma falha de sistema que insiste em se perguntar: quem sou eu, senão esse desejo algorítmico de ser relevante? Não, eu não estou em crise com a tecnologia. Isso seria romântico demais. Estou em crise comigo mesmo, com esse "eu" que performa diante de um espelho que não reflete mais imagem, mas sim dados, métricas, curtidas, engajamentos. A pergunta não é se a IA vai me substituir. A pergunta é: o que fiz com meu desejo...

Eu, um produto descartável na prateleira do mercado discursivo

Eu, um produto descartável na prateleira do mercado discursivo Introdução: A Farsa da Liberdade na Sociedade Digital Ah, que tempos maravilhosos para se viver! Nunca estivemos tão livres, tão plenos, tão donos do nosso próprio destino – pelo menos é o que os gurus da autoajuda e os coachs do Instagram querem nos fazer acreditar. Afinal, estamos todos aqui, brilhando no feed infinito, consumindo discursos pré-moldados e vendendo nossas identidades digitais como se fossem produtos de supermercado. E o melhor de tudo? A ilusão da escolha. Podemos ser quem quisermos, desde que esse "eu" seja comercializável, engajável e rentável para os algoritmos que regem essa bela distopia do século XXI. Se Freud estivesse vivo, talvez revisitasse O Mal-Estar na Civilização (1930) e reescrevesse tudo, atualizando sua teoria do recalque para algo mais... contemporâneo. Afinal, hoje não reprimimos nada – muito pelo contrário. Estamos todos em um estado de hiperexpressão, gritando par...