Na minha incessante busca por sentido neste vasto deserto discursivo, percebo que a verdade é, no mínimo, uma piada de mau gosto. Afinal, se a verdade fosse o ponto final de todas as angústias, por que ela apenas nos presenteia com a certeza da morte? Não é curioso que, enquanto corro atrás dela, só consigo me afastar daquilo que realmente importa – ou, quem sabe, daquilo que nunca importou? É como se cada clique em um botão de “curtir” fosse uma confirmação de que estou, de fato, perdido.
Camus dizia que devemos imaginar Sísifo feliz. Pois bem, eu me pergunto: seria ele tão feliz se tivesse uma conta no Instagram? Talvez, ao invés de empurrar a pedra, estivesse publicando stories de seu esforço absurdo, aguardando comentários que reforçassem sua existência. “Força, guerreiro!”, “Você consegue!” – e assim a pedra se tornaria um acessório do marketing pessoal. Mas e a felicidade? Ah, essa parece ficar para depois, entre uma notificação e outra.
A verdade, nesse sentido, é que estamos todos tentando ser deuses – pelo menos no universo das redes. Criamos discursos sobre discursos, espelhando-nos em algoritmos que nos dizem o que consumir, pensar e até sentir. Marx já havia alertado que o que consumimos molda nosso pensamento. Hoje, não só molda, como engessa. Minha lógica, meu desejo, minha subjetividade, tudo embalado para presente em um feed infinito.
E então vem a pergunta que não quer calar: o que é a verdade da morte sobre a nossa vida? Será que a encaramos com a coragem de Sísifo ou preferimos ignorá-la, publicando selfies filtradas da nossa efêmera imortalidade? Escolher viver implica, inevitavelmente, negar outras possibilidades. Essa é uma verdade angustiante, mas não há como escapar. Ou será que há? Talvez por isso continuemos falando, discursando, tecendo camadas e mais camadas de narrativa para evitar o confronto com aquilo que realmente nos constitui.
No final das contas, sinto que estou apenas empurrando outra pedra. Não há liberdade, só a ilusão dela. Mas será que essa ilusão é tão ruim assim? Se não há um sentido final, por que não inventar um? Ou melhor, por que continuar buscando algo que, no fundo, sabemos que não existe? Talvez a verdadeira liberdade esteja em aceitar que toda essa discursividade não nos liberta – e, ironicamente, é isso que nos mantém prisioneiros.
Referências
CAMUS, Albert. O mito de Sísifo. São Paulo: Record, 2017.
MARX, Karl. O capital: crítica da economia política. São Paulo: Boitempo, 2013.
KIERKEGAARD, Søren. O conceito de angústia. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
HAN, Byung-Chul. A sociedade da transparência. Petrópolis: Vozes, 2017.
NIETZSCHE, Friedrich. Crepúsculo dos ídolos. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
#maispertodaignorancia
@joseantoniolucindodasilva
Entre likes e filtros, descobri a verdade da minha existência: sou apenas um algoritmo ambulante, ajustado para consumir, postar e esperar validação em forma de corações digitais. Enquanto a morte ri da minha timeline, sigo acreditando que meu propósito está no próximo post perfeito. Afinal, se Sísifo é feliz com sua pedra, por que eu não seria com meu feed? - #maispertodaignorancia
Comentários
Enviar um comentário